arTeira trakkinna

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Amor filial:ADIVINHA QUANTO EU TE AMO, Fátima Miguez (Fund. do Livro Infantil e Juvenil)



Era hora de ir para a cama, e o Coelhinho agarrou-se firme nas longas orelhas do Coelho Pai. Ele queria ter certeza de que o Coelho Pai estava a ouvir.
-Adivinha quanto eu te amo ? - disse ele.
-Ah, acho que isso eu não consigo adivinhar - respondeu o Coelho Pai.
-Tudo isso - disse o Coelhinho, esticando os seus bracinhos o máximo que podia.
Só que o Coelho Pai tinha os braços mais compridos. E disse:
-E eu te amo tudo isto !
Huuum, isso é um bocado, pensou o Coelhinho.
-Eu te amo toda a minha altura - disse o Coelhinho.
-E eu te amo toda minha altura - disse o Coelho Pai.
Puxa, isso é bem alto, pensou o Coelhinho. Eu queria ter os braços compridos assim. Então o Coelhinho teve uma boa idéia. Ele se virou de ponta cabeça, apoiando as patinhas na árvore.
-Eu te amo até as pontas dos dedos de meus pés !
-E eu te amo até as pontas dos dedos dos teus pés - disse o Coelho Pai balançando o filho no ar.
-Eu te amo a altura de meu pulo ! - riu o Coelhinho saltando, para lá e para cá.
-E eu te amo a altura do meu pulo - riu também o Coelho Pai e saltou tão alto que suas orelhas tocaram os galhos das árvores.
-Eu te amo toda a estradinha daqui até o rio - gritou o Coelhinho.
-Eu te amo até depois do rio até as colinas - disse o Coelho Pai.
É uma bela distância, pensou o Coelhinho. Ele estava sonolento demais para continuar a pensar. Então ele olhou para além das copas das árvores, para a imensa escuridão da noite. Nada podia ser maior do que o Céu.
-Eu te amo ATÉ A LUA ! - disse ele, e fechou os olhos.
-Puxa, isso é longe disse o Coelho Pai. Longe mesmo !
O Coelho Pai deitou o Coelhinho na sua caminha de folhas. E então inclinou-se para lhe dar um beijo de Boa Noite.
Depois, deitou-se ao lado do filho e sussurrou sorrindo:
-Eu te amo até a lua... IDA E VOLTA !

ADIVINHA QUANTO EU TE AMO

Fátima Miguez (Fund. do Livro Infantil e Juvenil)


PARECER 1
O texto celebra o amor entre pai e filho aqui representados não por humanos, mas por dois coelhos, únicos personagens da história.

O fio condutor do enredo é a tentativa dos animais de mensurar o tamanho do amor que um sente pelo outro. É o filho quem inicia o diálogo na hora de dormir, no momento em que o pai vai acomodá-lo na cama.

As tentativas do filho de demonstrar o tamanho do amor, (usando o próprio corpo), esticando os braços, espichando o corpo e ficando na ponta dos pés, dando pulos cada vez mais altos, são sempre superadas pelas medidas do pai, maior e mais alto do que ele.

Quando se dá conta que o próprio corpo é muito pequeno para mensurar seu amor pelo pai, o filho procura no ambiente em que vivem outros elementos maiores do que ele. Assim compara o tamanho do seu amor com a estrada e com o rio até que descobre que nada é tão imenso quanto a distância entre a terra e a lua que brilha no céu e se dá por satisfeito. A história termina quando o pai acomoda o filho na cama de folhas e sussurra dizendo que também o ama até a lua, mas a distância de ida e de volta, ou seja, por mais que amor do filho seja grande, o do pai será sempre maior.

O autor consegue dar uma nova roupagem a um tema bastante desgastado e quase sempre conflitante: as relações entre pai e filhos. Histórias de pais que abandonaram filhos na floresta ou os confiaram aos cuidados de madrastas ciumentas foram muito exploradas na literatura, principalmente voltada para a criança desde os contos de fada. O autor, no entanto, consegue revigorar o tema ao abordar o amor na relação pai e filho, sem a presença da figura materna, que não só biologicamente, mas também por tradição mantém maior vínculo com os filhos em todas as culturas. O texto vem apoiado numa linguagem acessível à compreensão do leitor sem abrir mão da qualidade literária que se mantém na tradução do inglês para o português.

A ilustração em tons pastéis ocupando página inteira sobre a qual se insere o texto visualiza através de imagens o enredo, o que facilita a compreensão do leitor iniciante ao qual o texto supostamente se destina.

O formato quadrado do livro com páginas bem costuradas e arrematadas por capa dura dão ao leitor iniciante e ainda descuidado mais segurança no manuseio do objeto livro.

O tratamento do tema por um autor estrangeiro, abordando valores como o amor na relação pai e filho, por vezes esquecidos pela sociedade globalizada de consumo, mas fundamentais para a formação psicológica e emocional da criança, aliado às ilustrações e ao projeto gráfico justificam a escolha.

(Rosa Cuba Riche)

PARECER 2
Enquanto caminhavam para a cama, um Coelhinho e seu Coelho Pai iniciam uma travessia afetiva que reúne uma série de provas de amor. O enigma proposto pelo Coelhinho ao Coelho Pai é o seguinte: "Adivinha quanto eu te amo." Bem ao gosto do ser poético da infância, a questão é formulada como uma adivinhação onde a palavra manifesta-se de forma mágica, lúdica. O Coelhinho, que elabora a questão, é portador de um saber de natureza íntima, profunda. O Coelho Pai, no papel de adivinhador, deve esforçar-se para ampliar esse saber na condição de sábio, mais velho e mais experiente.

A questão proposta pelo filhote deixa o Coelho Pai constrangido sem uma saída imediata. O esperto Coelhinho, na tentativa de iniciar o Pai nessa experiência tão pessoal e necessária, apressa-se, "esticando os braços o mais que podia", e revela, nesse gesto, o tamanho do seu amor. Num passe de mágica, o Coelho Pai penetra no caminho dessa aprendizagem e estende os seus "braços mais compridos", ainda, afirmando que o seu amor pelo filho tem a extensão deste movimento do seu corpo. O Coelhinho, percebendo a amplitude desse amor, logo quer dilatar mais ainda a grandeza do sentimento e declara ao pai que o ama "toda a sua altura" de filhote bem esticado. O Coelho Pai, reduplicando o gesto do filho, estende-se ao máximo como prova desse amor. E, nesse bailado de afetos, as provas se sucedem e o Coelho filho vai compreendendo que o tamanho, o salto e a experiência do Coelho pai são sempre maiores e, portanto, conferem ao amor do pai uma dimensão mais extensa. Possuidor deste segredo, o Coelhinho adormece e o Coelho Pai abriga a sabedoria deste afeto.

Qual é o tamanho do amor? É possível medir a extensão dos nossos sentimentos? Eis as questões cifradas nesta filosófica fábula que reúne uma sábia aprendizagem: a necessidade da experiência afetiva, através de sucessivas provas, permite a cada ser elaborar a construção do seu amor.

O livro Adivinha quanto eu te amo, de Sam MacBratney, foi publicado originalmente em inglês e teve a sua primeira edição em 1994. As ilustrações de Anita Jeram resultam numa narrativa visual, com a leveza dos traços, a movimentação das cenas, que evolui paralelamente à do texto escrito. O lirismo do tema abordado é acentuado pela arte das ilustrações, inspiradoras de um deleite estético. O projeto gráfico também integra-se, perfeitamente, a qualidade do texto.

As fábulas estão relacionadas aos tempos inaugurais da Humanidade e sempre atraíram gerações e gerações de leitores. Adivinha quanto eu te amo é uma fábula moderna que traduz conhecimentos essenciais da natureza humana na atemporalidade sua força mítica. Sem dúvida, as crianças- leitoras brasileiras precisam ler e penetrar na universalidade desse fabuloso imaginário.

(Fátima Miguez)


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Adivinha quanto eu te amo.

Sam MacBratney. Il. Anita Jeram. Trad. Fernando Nunes. São Paulo:Martins Fontes,1996. 36p. Capa dura. (23 x 26 x 1cm - 350 gr)

Láurea "Altamente Recomendável - Tradução para a Criança" - 1996 - FNLIJ


Fundação do Livro Infantil e Juvenil
http://www.fnlij.org.br/

domingo, 31 de outubro de 2010

Fazendo biscuit country com Linda Santos: aprendendo e me superando



Nunca deixe que te coloquem para baixo

Estava me sentindo muito deprimida com sucessivos fatos profissionais que estavam deixando a auto estima muito baixa.
Um dia, comecei a fazer uma retrospectiva de minha vida e me veio a tona recortes da adolescência. Lembrei-me que sempre lutei muito para ser e ter o melhor. É verdade que, nesta época, lutava mais para ter.Vivia em condições miseráveis, pobreza e muita fartura(fartava tudo).Mas não me faltava coragem e determinação.Eu queria me vestir, namorar, freqüentar lugares, enfim, ter os mesmos direitos que as outras meninas e meninos de classe média tinham.
Eu era uma menina bonita.De cabelos negros, lisos e longos e um corpo escultural. Muito mocinha, vendia alumínio em dias de feira,sobre uma lona estirada no chão e levava cantada de homens nojentos, mal cheirosos,com características pedófilas,as quais eu fingia não escutar. Entretanto, nas festas do colégio onde estudava ou outros eventos sociais eu virava cinderela, com direito a perfume, roupas bonitinhas e leves paqueras com os meninos mais desejados.
Não era só alumínio que eu vendia para ter uma vida melhor.Durante a semana fazia muito artesanato, com destaque para crochet e bordados e a noite viajava e sonhava atraves dos livros. Virava as madrugadas, com um cotoco de vela acesa( não tinhamos energia elétrica), lendo, sob os protestos de minha mãe, que reclamava e reclamava, com medo que a casa pegasse fogo ou que eu ficasse como "Martim Doido", o qual ficou tantã de tanto ler.

Por que eu estava divagando nas minhas lembranças?
Veio a idéia de resgatar o gosto pelo artesanato. Crochet? Bordado? Não! Nada disto me encantava mais, talvez porque me lembrassem que os fazia por mera necessidade.

Na verdade eu queria fazer arte. Aproveitar a habilidade manual que tenho associada ao desejo de representar o mundo através da capacidade estética.
Pensei, então, em aprender a modelar porcelana fria( famoso biscuit). Queria aprender a técnica e começar a criar minhas próprias peças.
A despeito de não querer copiar, dirigi-me a um centro de artesanato para aprender o manejo do material, as técnicas, materiais, etc.

Naquele dia me senti muito ignorante, mais que isto, destrocei mais e mais minha auto estima, pois a professora me disse claramente que eu nunca iria conseguir modelar qualquer coisa, haja vistas que minhas mãos eram quentes.Voltei para casa muito triste.
Um misto de decepção e de raiva. Como àquela professora, menina novinha, de gosto duvidoso, poderia dizer-me que eu não seria capaz?
Depois do processo de elaboração de minhas emoções me vi diante do PC, navegando em busca de informações acerca desta arte. Quem eu encontrei na net? Uma expert na artcountry. Me deslumbrei com tanta beleza, com tanta sensibilidade. Linda é o seu nome! Lindas são suas peças. De beleza ímpar: criadora e obra.

Ainda em êxtase me vi em Sampa, em dias de setembro. Diante de um conceito em biscuit disse para mim mesma: serei capaz de fazer algo similar? Mas eu ja sabia a resposta senão não estaria ali, diante de uma artista como Linda. Neste momento meu lado bruxa aflorou, tanto para o bom quanto para o mal sentido, rsrsrs. Já antecipava que seria capaz, sim, pois a professora não era só uma artista do biscuit, mas, na essência uma artista na vida e na arte de conviver e ensinar.Meu lado ruinzinha dizia: ah, professorinha que me fez infeliz por um instante, ah se você me visse agora!

Durante uma semana eu me deliciei com a companhia de mestras da porcelana fria: Moniquinha, Beth, Tania...quantos momentos engraçados junto com Linda, Linda Santos, a mestra da artcontry.

Posso não ser uma artista, mas mostrei para mim mesma que àquela professora me empurrou para frente, não me botou para baixo. Hoje agradeço a ela por ter me dito aquilo, pois não me limitei à mediocridade.

Minha bruxa, criada por Linda, bem como minha camponesa, e executadas por mim, com seu apoio, estão em seu ateliê, esperando minha volta. Deixei-as lá, não só para secarem, mas principalmente para ter mais um motivo para voltar.